27 de fev. de 2012

Viagem aos Pampas

Um mês atrás, exatamente (que surpresa a minha ao conferir a exatidão disso - eu já ia dizer aproximadamente!), eu comecei minha Viagem aos Pampas. Essa é uma história real que não sei muito bem como contar.

A vida que eu levava antes de viajar constava de preocupações estranhas, porém tidas como normais para todos, de trabalho, carreira, dieta, reuniões sociais sem sentido, e bem... todas essas coisas tidas como vida normal para qualquer um. Eu digo estranha porque era estranho à mim - fora de mim - eu era realmente um observador observando, analisando tudo o que era feito e julgando se era bom ou não ou tanto fazia - como em muitos casos próprios observados. Eu levava uma vida estranha a mim mesmo.

Fui ao aeroporto ansioso por viajar. Tudo no horário, tudo sempre certo, tudo perfeito. Já estava pensando em contar isso a qualquer um que perguntasse "Como foi o seu vôo?". Lá vi minha amada L me esperando. Muito bom, muito lindo. Um abraço gostoso. Um beijo saudoso. Um contato especial.

Estava programada uma viagem ao interior, ao campo, uma fazenda plana e gostosa, calma. Antes de irmos me deparei com um livro na estante de L - "Viagem ao Oriente" de Hermann Hesse - e, como toda boa pessoa de fora, perguntei se podia levar para ler na viagem. Para o qual ela respondeu: "Porque você pergunta? É seu também."

Eu não sei porquê comecei este conto. Recentemente li em um livro de Eduardo Galeano - "El libro de los abrazos" - um presente de L para mim - uma passagem que dizia "(...) Cuando es verdadera, cuando nace de la necesidad de decir, a la voz humana no hay quien la pare. Si le niegan la boca, ella habla por las manos, o por los ojos, o por los poros, o por donde sea. Porque todos, toditos, tenemos algo que decir a los demás, alguna cosa que merece ser por los demás celebrada o perdonada." e de repente um turbilhão de imagens, de memórias e sensações me tomaram por completo e uma necessidade de dizer algo sobre elas, mas não sei bem o quê. Espero que algo saía desse esforço.

Estamos no meio da natureza, na fazenda de L, no seu campo onde ela é rainha e eu, seu consorte. Passamos uma noite agradável, com chuva e granizo, ventos fortes e ao mesmo tempo deliciosos barulhos eram feitos de tudo isso, você pode imaginar. Dormimos mais ou menos bem. No próximo dia recebemos uma família de amigos que nos acompanharam por 4 dias e 3 noites (não lembro ao certo a quantidade de tempo). A companhia deles era realmente agradável, tranquila e divertida. Jogamos alguns jogos de tabuleiro, cartas e dados. Conversamos e nos ensinamos coisas. Logo eles se foram, e eu e L tivemos nossa primeira noite verdadeira juntos. Sentamos a frente da lareira apagada e ela se pôs a falar...

Infelizmente não lembro muito do conteúdo. Infelizmente, porque ela realmente tinha coisas a dizer que seriam celebradas por muitos. Em instantes, minutos ou horas, eu estava em prantos. Ela me olhava com os olhos penetrados em meu ser. Impassível. Ela sabia o que queria de mim. É incrível como essas coisas acontecem, realmente. São inexplicáveis. Quase indizíveis, a não ser por símbolos muito bem construídos em alguma distante mitologia. Foram dias estranhos... Todo o meu "progresso" - trabalho, dieta, carreira, posses, conhecimentos, status - tudo isso foi por água a baixo. Acho que a chuva e o granizo estavam conspirando para isso. Não lembro o que foi dito, mas sei que mudei completamente, de repente.

Os próximos dias foram especiais. Eu estava lendo "A Montanha Mágica" de Thomas Mann e o curto livro de Hesse, "Viagem ao Oriente". Se o leitor já leu a Viagem, notará que tomei a liberdade de usar traços narrativos parecidos, mas não por preguiça, mas por um sentido mais profundo - não foi coincidência eu estar lendo esse livro - ele me permitiu dar vazões às minhas palavras de um jeito que eu não sabia que era possível. E realmente, não consigo expressar bem o que quero dizer.

Sinto estar falhando na minha narrativa... Quero falar sobre coisas muito difíceis de narrar. Instantes. Eternidade. Coisas fora do tempo - e dentro do mesmo. Quero falar sobre o Tao. Sobre o Amor. Sobre o Interior. Sobre Deus. E porquê? Não sei. Sei que falhei.

Hoje, ocupado com trabalhos e projetos, senti estar de volta ao progresso. Ontem um cara me disse que se você quer ter sucesso você tem que ser egoísta - esquece família, filhos, amigos, tudo - você em primeiro lugar e você em segundo. Você pode não pensar igual. Achar desprezível tal declaração. Mas um dia talvez você se encontre agindo assim... E surpresa, toda a "razão" estará ao seu lado. Espero que alguém como L te puxe para o lado de lá. Lá... Que não é lugar. Ou lado.

Reconheço, eu falhei.
Espero que você me perdoe.